A revitalização da orla está modificando o ecossistema de Matinhos, no Litoral. As cinco estruturas marítimas erguidas durante o projeto – espigão da Praia Brava, guias de correntes da Avenida Paraná e de Matinhos e os headlands dos balneários Riviera e Flórida – escondem uma variedade de organismos, espécies cada vez mais abundantes na região, pertencentes à chamada fauna incrustante.
De acordo com levantamento do consórcio DTA/Acquaplan, responsável pelo programa de monitoramento ambiental da obra, são mais de 46,3 mil, com prevalência de moluscos como conchas e caracóis.
Segundo especialistas, as novas estruturas fornecem os substratos necessários para a proliferação dos organismos, sobre os quais se desenvolve uma fauna incrustante, sedentária e diversa. Essa colonização está associada à dinâmica local (batimento de ondas, correntes e variação de maré), disponibilidade de alimento e às características físico-químicas do substrato na estrutura, que influenciam nos processos de dispersão e fixação das espécies.
Conforme estudos, a colonização destas regiões se dá em duas fases. A primeira pela formação de uma película por bactérias e detritos, e na sequência por meio do recobrimento primário por protozoários, diatomáceas e uma reduzida quantidade de macro-organismos (copépodes, cracas e poliquetas).
“Sob o ponto de vista ecológico e socioeconômico, a fauna associada a substratos consolidados é muito importante, pois contribui significativamente para a diversidade e produtividade biológica local”, explica a oceanógrafa do consórcio DTA/Acquaplan, Mayara Beltrão.
Segundo ela, essa fauna desempenha um importante papel na estrutura e nos processos ecossistêmicos, formando ligações tróficas (vias de alimentação) entre os ambientes marinho e terrestre por meio da regeneração de nutrientes e decomposição de matéria orgânica. “Além disso, são indicadores biológicos úteis, que fornecem uma compreensão das mudanças nas condições da qualidade ambiental”, destaca a oceanógrafa.
Já foram realizadas três campanhas de monitoramento da colonização da fauna incrustante. Essas ações ocorreram nos meses de maio, agosto e novembro de 2023 – outras mobilizações estão previstas para este ano. “Logo na primeira campanha os resultados mostraram uma fauna abundante e que cresce a cada monitoramento”, diz a oceanógrafa Thelma Scolaro, uma das coordenadoras da execução do projeto básico ambiental da recuperação da Orla de Matinhos.
As coletas são feitas em cinco pontos amostrais, distribuídos nas estruturas semirrígidas instaladas nos balneários Flórida e Rivieira, no Canal do Rio Matinhos, no espigão da Praia Brava e no guia de correntes da Avenida Paraná.
O material é recolhido através de um quadrante e uma espátula para raspagem dos organismos, em três alturas das estruturas, denominadas supralitoral (região mais alta das estruturas onde chegam apenas os respingos da quebra das ondas), mesolitoral (região submetida a variação da maré) e infralitoral (região permanentemente submersa).
Após a coleta dos organismos, as amostras são acondicionadas adequadamente e então levadas para laboratório, onde os conteúdos são separados, contados e identificados.
Esses organismos fazem parte da cadeia alimentar de muitos outros animais, comprovando que a região em que as estruturas foram instaladas proporcionará ambientes ricos para inúmeras espécies de peixes, tartarugas e aves. Isso já pode ser visto em áreas como os guias de correntes do Canal do Rio Matinhos, onde aves como biguás e as garças se aproveitam das águas calmas para alimentação e descanso.
“Por ser concentrado e ter em sua formação areia, pedra e magnetita, que é um material mais denso do que a areia, ele consegue ser mais resistente ao impacto das ondas e ressacas, aumentando a vida útil das estruturas e, consequentemente, da areia depositada no Litoral”, explica o diretor de Saneamento Ambiental e Recursos Hídricos do IAT, José Luiz Scroccaro.
Esse não é o primeiro exemplo de impacto da obra no ecossistema local. Estudo realizado pelo Consórcio mostra que foram avistados 56 grupos de botos-cinzas (SotaliaGuianensis) e toninhas (Pontoporiablaenvillei). Já as corujas-buraqueiras (Athene cunicularia) e caranguejos maria-farinha (Ocypode quadrata) foram atraídos pela engorda da faixa de areia e o replantio da restinga.
Fonte: AENPR